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Sobre a cimeira informal do Conselho Europeu

Quinta-feira, 19.11.09
Ratificado o Tratado de Lisboa por todos os Estados-Membros da UE, reuniu-se hoje, ao jantar, informalmente, o Conselho Europeu para prover os dois principais cargos criados pelo novo Tratado, posto que à data da entrada em vigor do mesmo já deverão estar preenchidos os cargos de Presidente do Conselho Europeu e de Alto Representante para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança da União Europeia.
A presidência do Conselho Europeu, recorde-se, deve o seu impulso a um entendimento franco-britânico tomado ainda no quadro da Convenção que preparou a entretanto abandonada Constituição Europeia. Impulso que foi de imediato visto com desconfiança por parte dos Estados médios e pequenos da UE, receosos de que os grandes países quisessem tomar conta dos destinos da União. Apesar da Constituição ter soçobrado nas urnas francesas e holandesas, a ideia sedimentou-se, fez o seu caminho e transferiu-se para o novo Tratado de Lisboa. O rol de competências atribuídas ao novo cargo, todavia, e como também é de regra nos textos comunitários, adequa-se a diferentes entendimentos e a diferentes práticas. Estaremos, seguramente, perante uma situação em que o «monge irá fazer o hábito», isto é, a figura escolhida será determinante na visibilidade e pró-actividade que a função vier a ter. E essa função poderá oscilar e variar entre a simples liderança das reuniões do Conselho Europeu ou uma mais activa representação da União nomeadamente em matéria de política externa (conjuntamente com o Alto Representante para os Negócios Estrangeiros e o Presidente da Comissão Europeia).
Aos chefes de Estado e de governo a escolha para ambos os cargos não se afigurava fácil - não pela ausência de pretendentes mas precisamente pelo seu excesso. E, sobretudo, pelos diferentes equilíbrios que deveriam ser estabelecidos: equilíbrios entre as diferentes famílias partidárias, equilíbrios geográficos, equilíbrios estratégicos e, finalmente, equilíbrios de género. Mas para além de todos estes equilíbrios havia um outro, fundamental, que não sendo nem estando escrito era, eventualmente, o mais importante de todos eles: escolher personalidades fortes e dotadas de carisma, ou escolher personalidades de baixo perfil e poucas expectativas que, no essencial, não afectassem o poder dos Estados-Membros e das suas lideranças no quadro da da União?
Ora, ao escolherem Herman Van Rompuy e Catherine Ashton para a Presidência do Conselho Europeu e para a diplomacia europeia, foi inequivocamente o segundo dos caminhos que foi trilhado. E a mensagem que inequivocamente passou para os observadores mais atentos ao fenómeno comunitário foi, precisamente, a de que os chefes de Estado e de governo optaram por nomear personalidades de baixo perfil, não dotadas de carisma e força política própria a nível europeu, que o mesmo é dizer, optaram por conservar e manter para si, no quadro do Conselho Europeu a essência dos poderes fundamentais da União, acentuando-lhe a componente intergovernamental. Poucos duvidarão de que Van Rompuy será mais um chairman do que um verdadeiro CEO do Conselho Europeu e, no que tange a Lady Ashton, só por distração se poderá esquecer que confiar uma nova política externa e de segurança que se diz que a UE quer ter a um(a) britânico(a), para mais sem qualquer experiência de diplomacia internacional, é pouco mais que grau zero de ambição política. Se nomes como o de Tony Blair, por exemplo - mas haveria mais - não foram escolhidos, não foi por terem estado com os EUA na guerra do Iraque ou motivos semelhantes (lembremo.nos que tal alinhamento, por exemplo, não inviabilizou a eleição de Durão Barroso) - foi, justamente, por terem carisma, peso político próprio e específico, enquadrarem-se mal no papel de figurantes, em síntese, foi por serem politicamente fortes em demasia e isso afectar o papel, o poder e a influência das lideranças dos Estados-Membros no projecto europeu.
Percebe-se, pois, que a generalidade dos líderes europeus e o próprio Presidente da Comissão Europeia, Durão Barroso, tenham rejubilado com as escolhas efectuadas. Não é de presumir que nenhum dos nomeados possa ofuscar os respectivos papéis e as respectivas influências.
Estas - e outras - reflexões que o tema me suscitou podem ser escutadas aqui, numa análise que a TSF teve a gentileza de me pedir para fazer a estas escolhas hoje anunciadas.

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publicado por Joao Pedro Dias às 01:11