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L'Allemagne, une seconde France

Quarta-feira, 27.06.12

«En 2000, dans son discours à l'université Humboldt de Berlin, Joshka Fisher, alors ministre des Affaires étrangères du gouvernement de Gerhard Schröder, donnait de l'Allemagne l'image positive, presque visionnaire, d'un pays qui voulait tirer l'Europe vers le haut. L'Allemagne, réunifiée depuis moins de dix ans, répondait ainsi à tous ceux qui craignaient le retour de sa puissance en faisant preuve d'un mélange harmonieux de modestie et d'ambition portés par un idéalisme européen empreint de réalisme.


Aujourd'hui, douze ans plus tard, à la veille d'un nouveau sommet européen, décrit, abusivement sans doute, comme celui de la dernière chance, l'Allemagne d'Angela Merkel apparaît au contraire, comme tirant l'Europe vers le bas.


L'Allemagne était justement perçue hier comme le moteur de l'idéal européen. Comment en est-elle venue à être vue aujourd'hui comme un frein, qui, par sa rigidité, sa certitude absolue d'avoir raison, risque de conduire l'Europe à l'implosion ? Comment expliquer cette transformation radicale de la perception sinon de la réalité de l'Allemagne?


A en croire le discours allemand officiel, rien n'a changé : l'Allemagne n'a jamais été plus fédéraliste, donc plus européenne. En fait, et c'est une ironie de l'histoire, les Allemands parlent aujourd'hui du projet européen comme le faisaient les Français avant la réunification de l'Allemagne. Vu de Paris alors, l'Europe était la poursuite des ambitions de la France par d'autres moyens : un multiplicateur d'influence et donc de puissance qui permettait de porter plus loin et plus fort la voix de la «Grande Nation». A l'époque, l'Allemagne, toujours divisée, voyait dans la construction européenne une protection contre le retour possible de ses démons intérieurs.


Quand aujourd'hui Berlin parle de l'Europe, c'est «à la française» et non plus «à l'allemande». L'Europe n'est plus pour elle un rempart contre ses « côtés noirs », mais le prolongement d'elle-même par le biais d'un fédéralisme qui lui est si naturel.


En réalité, le changement du regard des Allemands sur eux-mêmes a précédé la modification de notre regard sur l'Allemagne. Cette transformation est le produit de causes tout autant subjectives qu'objectives. Elle tient bien entendu d'abord au passage des générations. En sacrifiant son mark sur l'autel de l'Union, l'Allemagne a aussi le sentiment d'avoir assez donné.


En renforçant des déséquilibres existant entre l'Allemagne et le reste en Europe, la crise financière, économique n'a pas créé mais accéléré cette double transformation du regard.


Parce qu'elle est un pays de plus de 80 millions d'habitants qui a su maintenir ses traditions industrielles dans l'univers hypercompétitif de la globalisation, l'Allemagne a pu creuser l'écart entre elle-même et le reste de l'Europe. Parce que le chancelier Schröder a eu le courage de procéder à des réformes de structure bien avant les autres, l'Allemagne se retrouve désormais (à nouveau?) seule, dans sa catégorie de puissance.


Ce déséquilibre objectif ne saurait être contenu par une quelconque «alliance de revers» entre la France, l'Italie et l'Espagne. Une telle vision issue de l'époque du « concert européen » est parfaitement anachronique et profondément non européenne. Considérer que les peuples ne sont pas prêts à l'intégration fédérale la plus complète est une chose, les inciter au retour des nationalismes querelleurs en est une autre. Il existe l'Euro - la compétition européenne de football -pour servir d'exutoire aux nationalismes européens.


De la même manière, c'est une illusion de croire que la légitimité toute neuve de la France de François Hollande, opposée à la popularité déclinante d'Angela Merkel en Allemagne, suffira à rétablir l'équilibre entre nos deux pays.


L'essentiel est ailleurs. Il consiste à dire à l'Allemagne avec la plus grande fermeté et la plus grande douceur que, en campant sur ses positions, en se comportant vis-à-vis du projet européen comme une «seconde France», elle conduit l'Europe tout droit au mieux vers une « Europe gaulliste à l'anglaise », au pire vers une désintégration du projet européen.


Beaucoup d'économistes anglo-saxons accusent aujourd'hui Angela Merkel de conduire l'Europe, sinon le monde, à une crise similaire à celle des années 1930. Une comparaison historique qui est sans doute excessive. Mais, parce qu'elle est aujourd'hui le pays qui a objectivement le plus de pouvoirs en Europe, l'Allemagne aura plus de responsabilité que quiconque dans le succès ou l'échec du prochain sommet européen.» [Fonte]

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publicado por Joao Pedro Dias às 21:43

"Merkel está a apagar fogo" na Europa "com gasolina"

Segunda-feira, 04.06.12

«O ex-ministro dos Negócios Estrangeiros alemão Joschka Fischer afirmou hoje num artigo publicado no jornal 'Sueddetusche Zeitung', que a Europa "está em chamas, mas a chanceler Angela Merkel anda a tentar apagar o fogo com gasolina". Na opinião de Fischer, político do partido alemão Os Verdes, a Europa "está à beira do abismo e cairá nele nos próximos meses, e só poderá mudar de rumo se Berlim e Paris chegarem a acordo sobre uma união fiscal". O político ambientalista entende por união fiscal a compra ilimitada de dívida pública de países da moeda única pelo Banco Central Europeu e a mutualização das respetivas dívidas, através da emissão de "eurobonds". No artigo para o jornal de Munique, o ex-chefe da diplomacia alemã diz ainda que os tempos que correm "são graves, muito graves", e exorta a coligação de centro direita liderada por Merkel a alterar a sua política europeia. O porta-voz do governo alemão, Steffen Seibert, reagiu às posições de Fischer afirmando que a ação do executivo "não tem por objetivo destruir a Europa. O governo federal dá um grande contributo para o desenvolvimento da Europa, na crise atual". No artigo no Sueddetusche Zeitung, Joschka Fischer defende que "a estratégia de austeridade de Merkel só agrava a crise financeira e conduz à depressão", lembrando que a mesma estratégia também não serviu para suplantar a grande crise económica mundial de 1929. O político ambientalista refere ainda que, "se a Grécia se afundar no caos, haverá uma corrida aos bancos em Espanha, na Itália e em França que desencadeará uma avalancha capaz de soterrar a Europa". Para Fischer, que foi ministro dos Negócios Estrangeiros do governo de social democratas e ambientalistas, entre 1998 e 2005, só a Alemanha pode garantir a sobrevivência da zona euro, e com o seu potencial económico deve financiar programas de crescimento. Para isso, "vale a pena contrair mais dívidas", sublinhou. Fischer escreve ainda que "nunca a Alemanha esteve tão isolada" e que "ninguém percebe a política dogmática" de Merkel. "Na Europa acham que somos um condutor em contra-mão", afirmou o ex-MNE alemão.» [Fonte]

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publicado por Joao Pedro Dias às 23:40

A ameaça da amnésia alemã - by Joschka Fischer

Quarta-feira, 30.05.12

«A situação da Europa é séria – muito séria. Quem teria pensado que o primeiro-ministro britânico, David Cameron, apelaria aos governos da zona euro para reunir coragem para criar uma união fiscal (com orçamento e política fiscal comuns e dívida pública solidariamente garantida)? E Cameron defende também que a integração política mais profunda é o único caminho para parar a desagregação do euro.


Um primeiro-ministro britânico conservador! A casa europeia está em chamas, e Downing Street está a pedir uma resposta racional e resoluta do corpo de bombeiros.


Infelizmente, o corpo de bombeiros é liderado pela Alemanha, e o seu chefe é a chanceler Angela Merkel. Como resultado, a Europa continua a tentar apagar o fogo com gasolina – a austeridade imposta pelos alemães – com a consequência de que, em três meros anos, a crise financeira da zona euro se tornou numa crise existencial europeia.


Não nos iludamos: se o euro se desagrega, assim acontecerá à União Europeia (a maior economia do mundo), espoletando uma crise económica global numa escala que a maior parte das pessoas hoje vivas nunca conheceu. A Europa está à beira de um abismo, e certamente cairá nele a não ser que a Alemanha – e a França – alterem o seu rumo.


As recentes eleições em França e na Grécia, juntamente com eleições locais em Itália e distúrbios continuados em Espanha e na Irlanda, mostraram que o público perdeu a fé na rígida austeridade que a Alemanha lhes impôs. O remédio radical de Merkel colidiu com a realidade – e com a democracia.


Estamos mais uma vez a aprender da maneira mais difícil que este tipo de austeridade, quando aplicado no decorrer de uma crise financeira importante, apenas leva à depressão. Esta perspectiva devia ser do conhecimento comum; foi, apesar de tudo, uma lição importante das políticas de austeridade do Presidente Herbert Hoover nos Estados Unidos e do chanceler Heinrich Brüning na Alemanha de Weimar no início da década de 1930. Infelizmente, a Alemanha, entre todos os países, parece tê-la esquecido.


Como consequência, o caos paira na Grécia, assim como a perspectiva de próximas corridas aos depósitos bancários em Espanha, Itália, e França – provocando uma avalanche financeira que soterraria a Europa. E depois? Devemos desperdiçar o que mais que duas gerações de europeus criaram – um enorme investimento em construção de instituições que levou ao mais longo período de paz e de prosperidade na história do continente?


Uma coisa é certa: uma desagregação do euro e da União Europeia implicaria a saída da Europa da cena mundial. A política actual da Alemanha é ainda mais absurda à vista das amargas consequências políticas e económicas que enfrentaria.


Compete à Alemanha e à França, a Merkel e ao Presidente François Hollande, decidir o futuro do nosso continente. A salvação da Europa depende agora de uma mudança fundamental na atitude da Alemanha relativamente à política económica, e da posição da França relativamente à integração política e a reformas estruturais.


A França terá que dizer sim a uma união política: um governo comum com controlo parlamentar comum para a zona euro. Os governos nacionais da zona euro já estão a agir em uníssono como um governo de facto para lidar com a crise. O que se está a tornar cada vez mais verdade na prática deve ser levado a cabo e formalizado.


A Alemanha, por seu lado, terá que optar por uma união fiscal. Em última análise, isso significa garantir a sobrevivência da zona euro com o poder económico e os activos da Alemanha: aquisição ilimitada dos títulos de dívida pública dos países em crise pelo Banco Central Europeu, europeização de dívidas nacionais através de eurobonds, e programas de crescimento para evitar uma depressão da zona euro e para impulsionar a recuperação.


Pode imaginar-se facilmente a celeuma na Alemanha sobre um programa deste tipo: ainda mais dívida! Perder o controlo sobre os nossos activos! Inflação! Simplesmente não funciona!


Mas funciona: o crescimento induzido pelas exportações da Alemanha é baseado em programas desse tipo, em países emergentes e nos EUA. Se a China e a América não tivessem distribuído capital parcialmente financiado por dívida nas suas economias desde 2009, a economia alemã teria sofrido um sério golpe. Os alemães devem agora questionar-se se eles, que foram quem mais lucrou com a integração europeia, estão dispostos a pagar por esta o preço devido ou se preferem deixar que esta falhe. Para além da unificação política e fiscal e de políticas de crescimento para o curto prazo, os europeus precisam urgentemente de reformas estruturais dirigidas à restauração da competitividade da Europa. Cada um destes pilares é necessário para que a Europa ultrapasse a sua crise existencial.


Entenderemos nós, alemães, a nossa responsabilidade pan-europeia? Certamente não parece que assim seja. Na verdade, raramente esteve a Alemanha tão isolada como agora. Quase ninguém compreende a nossa política de austeridade dogmática, que vai contra toda e qualquer experiência, e consideram-nos bastante fora de rumo, senão mesmo dirigindo-nos para o tráfego que vem em sentido contrário. Ainda não é tarde demais para mudar de direcção, mas agora temos apenas dias e semanas, talvez meses, em vez de anos.


A Alemanha destruiu-se – e à ordem europeia – duas vezes no século vinte, e depois convenceu o Ocidente que tinha chegado às conclusões certas. Só desta maneira – reflectida vividamente no seu apoio ao projecto europeu – conseguiu a Alemanha consentimento para a sua reunificação. Seria simultaneamente trágico e irónico se uma Alemanha restaurada, por meios pacíficos e com a melhor das intenções, trouxesse a ruína da ordem europeia por uma terceira vez.» [Fonte]

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publicado por Joao Pedro Dias às 23:51

A chanceler que brinca com o fogo - by Joschka Fischer

Sexta-feira, 03.02.12

"A chanceler Angela Merkel deve andar feliz hoje em dia: os índices de aprovação do seu partido não são maus e os que a ela dizem respeito são muito bons. Já não tem adversários relevantes no centro direita da União Democrata-Cristã (CDU) e à esquerda, a oposição está fragmentada em quatro partidos. A sua resposta à crise europeia prevaleceu – ou pelo menos é a impressão que ela deixa transparecer, e aquela em que a maioria dos alemães acredita. Portanto, tudo corre bem no reino alemão, certo?

 

Não vamos pôr o carro à frente dos bois. Existem dois assuntos que poderão complicar a candidatura de Merkel às próximas eleições, no Outono de 2013. A nível interno, o seu parceiro de coligação, o Partido Democrático Liberal (FDP), está a desintegrar-se. Mesmo que o FDP sobreviva às próximas eleições (o que não é, de modo algum, certo), é muito pouco provável que a actual coligação mantenha a sua maioria parlamentar, o que deixaria Merkel cada vez mais dependente do Partido Social Democrata (SPD). Embora talvez este facto não a preocupe muito enquanto mantiver o cargo de chanceler, Merkel vai enfrentar – pela primeira vez – um adversário, Sigmar Gabriel, o líder do SPD, que constituirá um risco para ela se o subestimar.


Mas o verdadeiro perigo para Merkel vem do exterior: a crise europeia. Se tiver pouca sorte, a crise atingirá o auge logo no início do ano eleitoral alemão e todas as previsões anteriores poderão ser contestáveis, porque, apesar da frustração alemã relativamente à Europa, o eleitorado poderá castigar severamente aqueles que deixaram a Europa cair.


A economia da União Europeia está a mergulhar numa recessão grave e, muito provavelmente, duradoura, em grande parte auto-infligida. Enquanto a Alemanha ainda está a tentar dissipar o fantasma da hiperinflação, através de medidas rigorosas de austeridade, os países críticos da UE enfrentam uma séria ameaça de deflação, com consequências potencialmente desastrosas. É apenas uma questão de tempo – e já não falta muito – para que a instabilidade económica dê origem à instabilidade política.


A Hungria, onde a regressão democrática parece ganhar terreno, oferece uma antevisão de uma Europa onde a crise e a deflação da zona euro persistem. O ambiente nos Estados-membros mediterrânicos da UE e também na Irlanda começa a aquecer, devido não só ao aperto da austeridade, mas também – e talvez mais importante – à ausência de políticas capazes de oferecer às pessoas a esperança de um futuro melhor. A natureza explosiva das tendências actuais, que apontam para uma renacionalização da soberania da base para o topo, é largamente subestimada em Berlim.


A crise atingiu agora a Itália e ameaça estender-se à França. Ao eleger Mario Monti para o cargo de primeiro-ministro, a Itália mobilizou os seus melhores, e nem a Itália nem a Europa irão obter um melhor governo num futuro previsível. Se a administração de Monti for derrubada – quer no Parlamento quer nas ruas – a quarta maior economia da UE poderá desmoronar. Monti pede ajuda com urgência. Onde é que está essa ajuda?


Também não devem ser ignorados os desenvolvimentos em França (a segunda maior economia da zona euro) neste ano de eleições presidenciais. Se a maioria dos franceses começar a acreditar que lhes está a ser imposta do exterior uma linha de acção – e logo pela Alemanha! – irá responder com forma tradicional de teimosia gaulesa.


O que está em risco não é tanto o resultado das eleições, mas sim a margem entre o Presidente Nicolas Sarkozy e a líder de extrema-direita da Frente Nacional, Marine Le Pen – e se ela o vai ultrapassar de forma a ficar garantida para a segunda volta das eleições contra o candidato socialista. Apesar de ser pouco provável que ela ganhe a presidência, poderia restruturar e realinhar a direita francesa. Por esta razão, um fracasso de Sarkozy iria reduzir drasticamente o espaço de manobra do seu sucessor socialista na política europeia, alterando fundamentalmente a posição da França na Europa.


Mas, enquanto o desfecho das eleições francesas depende de forma crucial das políticas de crise europeias, o governo alemão age como se isto não lhe dissesse respeito. Em vez disso, o assunto principal – e quase exclusivo em Berlim – são as eleições que se aproximam. E a questão central não é "O que deve ser feito de imediato no interesse da Europa?" mas sim "Quanto é que se pode esperar que as pessoas na Alemanha aceitem – em particular, quanta honestidade?". Ninguém irá agir de forma a comprometer as suas perspectivas eleitorais, pelo menos enquanto ainda houver alternativas. Logo, é admissível que a Alemanha não esteja realmente interessada num esforço sério para resolver a crise europeia, porque isso implicaria correr grandes riscos e investir muito dinheiro.


A coligação CDU-FDP prefere disfarçar a situação convencendo-se da existência de uma conspiração anglo-saxónica, incentivada pelos países europeus em crise que se mostram pouco disponíveis para produzir e aplicar reformas e cujo único objectivo é fazer com que os alemães paguem. Até à data, a coligação de Merkel pode comparar-se a um condutor que conduz em contramão, convencido de que todos os outros é que vão no sentido errado.


A desintegração europeia já avançou muito mais do que pode parecer. A desconfiança e o egoísmo nacionais estão a propagar-se rapidamente, devorando a solidariedade europeia e o objectivo comum.


A nível institucional, a Europa tem-se mantido no caminho certo desde a última cimeira, mas ameaça desintegrar-se, da base para o topo. Para salvar o euro – o que é fundamental, pois o destino do projecto europeu depende do sucesso da união monetária – a Europa precisa de intervenção imediata: para além de medidas indispensáveis de austeridade e de reformas estruturais, só é possível ter êxito com um programa económico viável que assegure o crescimento.


E isso não vai ser barato. Se o governo de Merkel acredita que defender apenas verbalmente o crescimento é suficiente, então está a brincar com o fogo: um colapso do euro, cujas graves queimaduras não seriam apenas sofridas pelos alemães." [Fonte]

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publicado por Joao Pedro Dias às 20:20

Como os mercados integraram a Europa - by Joschka Fischer

Terça-feira, 10.01.12

"Durante os últimos dois anos, sucessivas cimeiras europeias terminaram com garantias de que – finalmente – as medidas necessárias para conter a crise da dívida soberana na zona euro tinham sido tomadas. Muitas foram publicamente retratadas como avanços importantes, embora essa nunca tenha sido a realidade. Como regra, demorou cerca de três dias antes dos mercados recuperarem e de a crise entrar noutra ronda.

 

Como os líderes políticos da Europa falharam em resolver a crise eficazmente, o custo para terminá-la subiu. Na verdade, permitiu-se que uma facilmente manejável crise financeira na Grécia crescesse até se tornar uma emergência ameaçadora para os estados na periferia meridional da União Europeia – e para o projecto europeu como um todo. Isto foi estadismo no seu pior e a maior parte da culpa desta situação pode ser atribuída à chanceler alemã Angela Merkel.

Na verdade, antes da cimeira europeia de Dezembro em Bruxelas, o capital de confiança no Conselho Europeu estava já tão esgotado que ninguém parecia tomar seriamente as suas decisões. Certamente, o veto do Reino Unido às alterações que a cimeira propôs ao Tratado de Lisboa pode ter submergido tudo o resto, ao mesmo tempo que aumentou a desconfiança por parte do público e dos mercados financeiros numa Europa dividida.

Mas falar sobre uma divisão da UE é um disparate. Nenhum primeiro-ministro britânico poderia consentir numa mudança de tratado para criar uma união fiscal sem ter de organizar antes um referendo nacional, cujo resultado forçaria o Reino Unido a abandonar a UE. E nenhum líder da UE no perfeito uso das suas faculdades poderia ter interesse nisso. O Reino Unido tem todo o interesse em terminar a crise e em preservar um euro forte, tal como os europeus no continente precisam dos britânicos dentro da UE.

Por isso ficou claro desde há meses que uma base legalmente vinculatória para avançar no sentido de uma união fiscal europeia, embora indispensável, só poderia ocorrer fora do enquadramento do Tratado de Lisboa, nomeadamente numa base intergovernamental e como um UE-17 ou um UE-17+, tal como aconteceu. Além disso, a hipótese alarmista de uma “divisão” negligencia a realidade de que a UE e a união monetária desde há muito se movem a velocidades diferentes.

O veto britânico, e a algazarra que causou, foi por essa razão algo que a Europa podia ter dispensado, e Cameron cedo se arrependerá de se ter oferecido como refém aos seus correligionários eurocépticos. Fortalecê-los enfraquecerá drasticamente a influência do Reino Unido na UE.

Tudo isso é ainda mais verdade porque a cimeira de Bruxelas abriu a porta para a união fiscal a UE-17+. Se um novo tratado for negociado em Março de 2012 e ratificado nos meses seguintes, a UE terá dado um passo notável em frente – na verdade, apenas ficando a um passo de distância duma verdadeira união política, que terá de seguir-se se a Europa quiser acabar de uma vez com a crise.

E, no entanto, a confiança nas decisões recentemente tomadas em Bruxelas permanece baixa, devido não só à confiança dissipada e ao espalhafato sobre o veto britânico, mas também à aparente ausência de medidas para intervir na crise actual. Mas isto, também, é um conceito errado.

Se lermos as decisões tomadas em Bruxelas, imediatamente notamos que a Alemanha e outros países ricos da UE receberam todos os mecanismos e garantias de estabilidade que tinham requerido previamente, deixando-os sem razões para continuar a recusar medidas de intervenção de crise, incluindo garantias financeiras apropriadas. A recente cimeira em Bruxelas abriu o caminho para uma união fiscal, incluindo simultaneamente um pacto de estabilidade e – criticamente importante – um pacto de responsabilidade comum. Na Alemanha, nada disto ainda foi interiorizado.

No curto prazo, a união de responsabilidades deverá ser implementada pelo Banco Central Europeu, cuja independência será outra vez tida como sagrada em Berlim, fornecendo uma folha de figueira europeia para as prioridades de política interna da Alemanha. Por este ponto de vista, Merkel devia estar grata a Cameron pela distracção que este criou em Bruxelas.

E a quem devemos agradecer por todo este progresso europeu? Devemo-lo à sabedoria dos líderes políticos da Europa, particularmente à de “Merkozy”, o estranho casal formado por Merkel e pelo Presidente francês, Nicolas Sarkozy?Infelizmente, não: o progresso resultou quase exclusivamente da pressão dos malquistos mercados financeiros. Tal como o antigo primeiro-ministro italiano Silvio Berlusconi foi deposto não por oponentes políticos, mas por investidores nervosos, foram os mercados, não os líderes europeus, quem abriu a porta à união fiscal e política na Europa.

Isso não é motivo para celebração. Pelo contrário, reflecte como os políticos europeus têm falta de visão estratégica suficiente e de coragem para resolver a crise da zona euro – e também para regular os mercados.[Fonte]

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publicado por Joao Pedro Dias às 02:38