Casa Europa
Anotações (quase) diárias sobre os caminhos da Europa e da União Europeia
Novas regras de Schengen limitam livre circulação e enfurecem o Parlamento Europeu
«Os ministros da administração interna da União Europeia (UE) acertaram nesta quinta-feira novas regras para o espaço Schengen que lhes permitirão reinstituir os controles de identidade nas fronteiras internas em caso de pressão migratória descontrolada. A decisão retoma a proposta franco-alemã de Abril passado que defendia a possibilidade de os Estados decidirem de forma unilateral repor os controles quando um país com a responsabilidade de vigiar uma fronteira externa, não consiga assegurar os devidos controles. A Grécia e a sua extensa fronteira com a Turquia, por onde se calcula que entrem todos os anos mais de 100 mil imigrantes clandestinos, é o principal país visado. Esta questão foi uma das grandes bandeiras eleitorais do ex-presidente francês, Nicolas Sarkozy, durante a campanha para a sua reeleição e que foi duramente criticada por vários países e pelo seu adversário socialista, François Hollande, eleito a 6 de Maio. Apesar disso, a decisão foi tomada por unanimidade dos 27 – incluindo o novo ministro francês, Manuel Valls – e ao arrepio da opinião da Comissão Europeia. O acordo "não é um mecanismo europeu" e "põe-nos à mercê das pressões populistas nos Estados", denunciou Cecilia Malmström, comissária europeia responsável pelos assuntos internos. O Parlamento Europeu criticou igualmente a decisão considerando, pela voz do seu presidente, Martin Schulz, que põe em causa um dos maiores "pilares da UE", a livre circulação sem controles nas fronteiras internas entre os 25 Estados de Schengen (todos os países da UE menos o Reino Unido, Irlanda, Chipre, Bulgária e Roménia, a que se juntam a Suíça, Noruega e Liechtenstein). As actuais regras já permitem que os governos reponham unilateralmente as fronteiras em caso de ameaça à segurança e ordem pública, como fez agora a Polónia antes do campeonato de futebol Euro 2012. A decisão dos ministros acrescenta agora a possibilidade de encerramento unilateral das fronteiras nos casos em que "o controle de uma fronteira externa do Espaço deixa de ser assegurado por causa de circunstâncias excepcionais". Nestas situações, os controles podem ser repostos por um período de seis meses, renovável por idêntico prazo. O ministro francês assegurou que o seu país não tem qualquer intenção de fechar unilateralmente as fronteiras mas insistiu em que "em situações de crise ou excepcionais os Estados membros de Schengen devem poder recuperar a sua soberania". Além da crítica à limitação da livre circulação, os eurodeputados insurgiram-se de forma particularmente veemente contra um outro aspecto do acordo dos ministros que exclui o PE das decisões relativas a Schengen. Para isso, os 27 alteraram unilateralmente a base jurídica da proposta da Comissão Europeia, de forma a que a participação do PE passou de co-decisão com o Conselho, para meras opiniões não vinculativas. "Com esta decisão, o Conselho enviou um sinal claro que é que eles encontrarão qualquer pretexto para fechar as fronteiras como nos fecham todas as portas a nós", protestou Guy Verhofstadt, presidente do grupo Liberal. "Não podemos aceitar isto", prosseguiu, interrogando-se se o PE não deverá suspender todas as negociações legislativas em curso com o Conselho se este não mudar de posição. Acusando igualmente os ministros de terem optado pelo "confronto" com o PE, Carlos Coelho, eurodeputado português do PSD, considerou que a decisão de limitação da livre circulação de cidadãos constitui "um retrocesso gigantesco". "O Parlamento não tem a intenção de pôr em questão as competências dos Estados membros quando se trata de garantia a segurança e a ordem pública", afirmou em comunicado. "No entanto, o encerramento das fronteiras que têm estado abertas até agora é uma questão que diz respeito a toda a Europa. Neste caso as instituições comunitárias têm de ser incluídas no processo de tomada de decisão", sem o que "estaremos a escancarar a porta ao populismo", afirmou. Vários grupos parlamentares anunciaram a intenção de apresentar queixa ao Tribunal de Justiça da UE contra o Conselho de ministros.» [Fonte]
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Por um pacto mediterrânico
Durante a ronda de preparação para o Conselho Europeu de amanhã e de sexta-feira, desta feita a cargo do MNE Paulo Portas, a delegação do CDS-PP sustentou que a União Europeia deve apertar o controlo das fronteiras europeias para travar as vagas de imigração e sugeriu mesmo que a União Europeia poderia fazer um pacto com os países de origem destes imigrantes.
A tese não é nova ou original mas não é por isso que deixa de ser sensata. No fundo, e numa altura em que a fronteira da pobreza marcha aceleradamente para norte e aproxima-se de nós, estamos perante a recuperação quer do velho processo de Barcelona quer, sobretudo, da sonhada mas pouco concretizada União Mediterrânica idealizada em 2008 por Sarkozy. Qualquer um destes processos já continham, entre as suas preocupações, a necessidade de regular os fluxos migratórios entre as duas margens do Mediterrâneo – tendo sempre presente que a capacidade de acolhimento da UE não é ilimitada e que em lugar de criar falsas esperanças ou prometer novos oásis aos cidadãos africanos e magrebinos, a UE deve empenhar-se fortemente em criar condições para que esses povos, muitos deles recém-libertos de regimes opressivos, permaneçam nos seus territórios de origem. De preferência a «boat—peoples» dos tempos modernos, que deixam ver a terra prometida mas apenas respondem com campos de refugiados ou repatriamentos imediatos.
Também isso significa estabelecer um maior controlo sobre as nossas fronteiras externas e uma maior seriação das pessoas que podem e não podem ficar no espaço europeu. Essa é, inquestionavelmente, a longo prazo, a única maneira de resolver este problema.
Mas é também a forma inteligente de evitar a sucessão de suspensões unilaterais dos Acordos de Schengen que nos últimos tempos começaram com a França, a Itália e já se estenderam à Dinamarca.
Quando a iniciativa política voltar à União Europeia e a Comissão Europeia retomar o papel que lhe incumbe por força dos Tratados, pode ser que a sugestão hoje apresentada faça o seu caminho e seja aproveitada.
Foi este, em síntese, a essência do comentário tecido aos microfones da TSF e que pode ser escutado aqui.
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Acordos de Schengen
Os Acordos de Schengen têm estado na ordem do dia da agenda europeia dos últimos tempos. Retorno, por uma questão de método e de recordatório, ao que sobre o assunto escrevi no âmbito do programa Europa dos Resultados e que está publicado no site no respectivo projecto, aqui.
«Diferentes interpretações de alguns Estados-Membros das Comunidades Europeias sobre o sentido de normas dos Tratados relativas à livre circulação de pessoas levaram a que, em 1985, à margem das Comunidades e num quadro estritamente intergovernamental, fosse assinado o Acordo de Schengen entre a França, a Alemanha, a Bélgica, a Holanda e o Luxemburgo. Mediante tal Acordo, os Estados signatários suprimiram gradualmente os controlos nas fronteiras comuns, instaurando um regime de livre circulação para todos os nacionais dos Estados signatários, dos outros Estados da Comunidade ou de países terceiros. A implementação desta medida obrigou os referidos Estados-Membros a concertarem as suas posições num vasto conjunto de políticas e decisões técnicas, para que a livre circulação de pessoas acordada não pusesse em causa, sobretudo, a segurança dos cidadãos. Só em 1990, cinco anos após a assinatura do Acordo inicial, os Estados outorgantes assinaram a Convenção de Execução do Acordo de Schengen que operacionalizou e permitiu concretizar a livre circulação de pessoas.
Gradualmente os Acordos de Schengen – Acordo e Convenção – foram sendo assinados por outros Estados-Membros da UE a ponto de, na conferência intergovernamental que conduziu ao Tratado de Amesterdão, quando já eram treze os Estados-Membros da UE que tinham igualmente aderido aos Acordos de Schengen, ter sido decidido integrar todo o acervo do Sistema de Schengen na UE.
Assim, sequencialmente, a Itália assinou os Acordos em 1990, a Espanha e Portugal em 1991, a Grécia em 1992, a Áustria em 1995 e a Finlândia, a Suécia e a Dinamarca em 1996. Os 12 Estados-Membros que integraram os dois últimos alargamentos aderiram ao acervo de Schengen no momento da respectiva adesão à UE; todavia, apesar dessa adesão, Chipre, Bulgária e Roménia ainda não aboliram os controles fronteiriços. O Reino Unido e a República da Irlanda, porém, apenas participam parcialmente no acervo de Schengen, mantendo, por exemplo, os referidos controlos.
Para além dos Estados-Membros da UE, a Islândia, a Noruega e a Suíça, fazem já parte do espaço de Schengen.»
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E agora..... a Dinamarca
Primeiro foram a França e a Itália - em cimeira estritamente bilateral e à margem das instituições comunitárias, Sarkozy e Berlusconi acordaram em alterar os Acordos de Schengen por forma a repor os controles fronteiriços travando a vaga de refugiados do Magrebe para a Europa; a seguir, juntou-se-lhes a Alemanha. Sensível a estes argumentos, Durão Barroso e a sua Comissão, apesar de negarem quaisquer cedências a visões xenófobas no debate hoje mesmo travado no Parlamento Europeu, deram sinais de tergiversar, disponibilizando-se para patrocinar as alterações necessárias aos Acordos de Schengen. Isto no mesmo dia em que a Dinamarca anuncia para breve a reposição dos controles fronteiriços nas suas fronteiras com a Suécia e com a Alemanha, invocando o aumento da criminalidade transnacional e o incremento da emigração ilegal. Decerto - os Acordos de Schengen, mesmo na sua formulação actual, permitem que em circunstâncias excepcionais os Estados que os assinaram possam suspendê-los e restaurar temporariamente os controles fronteiriços. Portugal, por exemplo, fê-lo recentemente pelo menos em dois momentos: por ocasião da realização do Euro2004 e aquando da realização em Lisboa da última cimeira da Aliança Atlântica. Entendamo-nos, porém: estas suspensões constituem a excepção e não a regra. E como excepção que são não se podem nem se devem transformar em instrumentos permanentes a que os Estados lançam mão, sob pena de a excepção se estar a transformar em regra. E aquilo que os Estados referenciados parecem propor e pretender é precisamente que a excepção vire regra. O que será absolutamente incompatível com as regras vigentes. Mas, devemos reconhecê-lo, há uma razão substancial para esta sucessão de atitudes de alguns Estados da União. É preciso nao esquecer que os Acordos de Schengen e a abolição dos controles fronteiriços nas fronteiras da União constituem apenas uma face de uma moeda que tem, na outra face, a obrigação que remonta já ao Tratado de Maastricht de as políticas de imigração, asilo e vistos serem políticas comunitárias, definidas no plano da União e subtraídas à jurisdição dos Estados da União. Não podia haver uma face da moeda sem a outra. Ora, 20 anos depois de Maastricht, o que constatamos é que, uma vez mais, a incumbência comunitária ficou pela metade. Foram assinados os Acordos de Schengen, foram abolidos os controles fronteiriços, mas não se avançou o que se devia ter avançado ao nivel comunitário em matéria de políticas de imigração, asilo e vistos. A essência destas políticas - sobretudo das políticas de imigração e asilo - permaneceu fortemente nacional. Entregue à jurisdição dos 27 Estados-Membros da União no que de fundamental e essencial possuem. Os resultados estão à vista - na falta de uma forte. homogénea e coerente política de imigração e asilo, cada Estado tenta defender os seus interesses da forma que se lhe afigura mais consentânea com os seus interesses - que não têm, necessariamente, de ser os interesses comuns. E assim, lentamente, vamos assistindo à renacionalização de políticas que se pretenderam comuns e comunitárias, vamos assistindo à desconstrução do projecto europeu, vamos constando que esse mesmo projecto «avança» de retrocesso em retrocesso. O que, nos tempos que correm, de acentuada crise económica, financeira e social um pouco por toda a Europa e também nas suas proximidades, não está dito nem escrito em lado algum que seja o melhor dos caminhos a trilhar. Foram estas as reflexões que pretendi partilhar aos microfones da TSF quando me foi pedido um comentário a esta nova situação e que pode ser escutado aqui.
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Alemanha apoia reforma de Schengen
A Alemanha juntou-se à França e Itália na ideia de reformar o tratado de Schengen, que estabelece a livre circulação de pessoas e bens no espaço europeu, de modo a dotá-lo de "novas cláusulas que permitam adaptá-lo a novas exigências". Como pano de fundo está a imigração em massa de tunisinos desde que o regime ditatorial foi derrubado. O apoio foi expresso por Hans-Peter Friedrich, ministro do Interior alemão, escreve o El Mundo. Um porta-voz do ministério admitiu ao jornal Frankfurter Allgemeine que, em casos extremos, as fronteiras do interior do espaço Schengen podem ser susceptíveis de reposição dos postos de controlos, de modo a que certas práticas excepcionais sejam simplificadas e rotineiras. Não é este, assumidamente, o caminho que a União deve trilhar - a política de imigração deve ter uma clara componente europeia que lhe é recusada por estas exigências nacionais que começam a emergir no espaço europeu.
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A UE e a crise humanitária no Magrebe
Em nova crise política e humanitária, no Magrebe, a UE volta a estar ausente. A França reage segundo os seus interesses próprios suspendendo (irregularmente) a sua participação espaço Schengen. Numa UE a funcionar isto não aconteceria, pois já haveria uma política comum implementada, como mandam os Tratados. Fica uma síntese das declarações que prestei à TSF sobre a matéria e que podem ser escutadas aqui.