Casa Europa
Anotações (quase) diárias sobre os caminhos da Europa e da União Europeia
Voltando à golden-share do Estado na PT
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Em finais de 2005 a Comissão Europeia enviou um pedido oficial de explicações ao governo português - a que este respondeu - convidando-o a explicar a sua situação accionista na PT.
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Não tendo as respostas nacionais sido consideradas satisfatórias, em finais de Março de 2006 a Comissão Europeia deu início ao segundo momento do processo de infracção, dirigindo a Portugal um parecer fundamentado em que sustentava que os direitos especiais detidos por Portugal na PT funcionavam como um desincentivo ao investimento estrangeiro, violando as regras comunitárias, no que respeita à livre circulação de capitais e direito de estabelecimento no território europeu.
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Foi, então, concedido a Portugal um prazo de 2 meses no qual o Estado pôde fazer uma de duas coisas: conformar-se com a orientação de Bruxelas e prescindir da dita posição de prevalência accionista na referida empresa ou sustentar a sua manutenção e fundamentar essa sustentação esperando com ela convencer as autoridades comunitárias.
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Portugal optou por contestar a posição da Comissão Europeia - mas sem êxito, sem apresentar argumentos que convencessem o executivo de Durão Barroso da conformidade dos direitos detidos na PT com as regras comunitárias.
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Em Outubro de 2006 a Comissão Europeia decidiu alargar o prazo para Portugal apresentar os seus argumentos antes de remeter o caso ao Tribunal de Justiça.
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Finalmente, em Janero de 2008, face à irredutibilidade da posição do governo português e à improcedência dos argumentos apresentados, a Comissão Europeia decidiu avançar com o procedimento judicial contra Portugal por violação de uma série de regras e princípios estruturantes do mercado comum.
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Em primeiro lugar, o direito comunitário não se opõe à participação do Estado no capital social de empresas; nem impede a participação do Estado português no capital accionista da PT;
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Em segundo lugar, aquilo que é considerado - pela Comissão Europeia e pelo Tribunal de Justiça da União - como contrário ao direito comunitário é a desproporção entre a posição accionista detida pelo Estado e os direitos societários associados a essa posição accionista. No caso concreto, o Estado português detém apenas 500 acções de tipo A na PT (equivalentes a cerca de 1,18% do capital social da empresa) às quais, todavia, aparecem associados uma série de direitos fundamentais e essenciais para a vida da sociedade, de todo desproporcionados com a dimensão da participação social respectiva.
Nessa medida haverá que averiguar até que ponto a decisão anunciada pelo Primeiro-Ministro consubstanciou um efectivo exercício dos direitos associados à golden-share de que o Estado dispõe. No plano puramente formal, talvez não. No plano material ou substantivo, claramente sim. José Sócrates não hesitou em mostrar «quem manda» na empresa relativamente às principais decisões que na mesma hajam de ser tomadas. E mesmo que não tenham havido reuniões formais de Conselho de Administração ou de Assembleia Geral para que os representantes do accionista Estado pudessem exercer os poderes conexos às suas acções, por uma questão de economia processual o assunto do negócio PT/Prisa morreu no momento em que Sócrates disse «não». De facto o Estado exerceu inequivocamente e em toda a sua dimensão a plenitude dos poderes que detém na PT. Talvez não tenha muitas outras oportunidades para repetir o exercício desse poder - assim o Tribunal de Justiça do Luxemburgo julgue o processo que se encontra pendente.