Casa Europa
Anotações (quase) diárias sobre os caminhos da Europa e da União Europeia
Lech Kaczynski. In memoriam.
A Polónia está de luto. Em brutal acidente de aviação que praticamente dizimou e decapitou a cúpula político-militar de Varsóvia, o Presidente Lech Kaczynski e o seu séquito contam-se entre as vítimas mortais da queda do Tupolev Tu-154, ao serviço do Governo de Varsóvia, que esta manhã se despenhou pouco antes da aterragem em Smolensk, na Rússia, quando se deslocavam para uma homenagem às vítimas polacas das tropas russas no massacre das florestas de Katyn, durante a segunda guerra mundial. Fundadores do partido Direito e Justiça (PiS), os gémeos Lech e Jaroslav Kaczynski começaram a ter actividade política na oposição do regime comunista da Polónia nos anos 1970, e assumiram um papel importante nas greves nos estaleiros de Gdansk, um protesto liderado pelo movimento Solidariedade de Lech Walesa. Os dois eram aliados de Walesa, e Lech Kaczynski foi mesmo chefe da segurança nacional no primeiro governo do antigo líder operário. Mas a relação entre os Kaczynski e Walesa azedou – Kaczynski defendia a continuação da “terapia de choque” para a economia polaca ao contrário de Walesa, lembra a Reuters. Assim, acabou despedido do Governo. A relação continuou a deteriorar-se e em 2009 Walesa processou mesmo o Presidente Lech Kaczynski alegando que este tinha colaborado com os serviços secretos nos anos 1970, recorda a BBC on-line. Em 2001 Lech e o seu irmão gémeo fundam o partido Direito e Justiça (PiS), com foco nos valores socialmente conservadores e uma tónica nacionalista, que havia de os levar ao poder; Lech como Presidente em 2005; Jaroslaw como primeiro-ministro em 2006, criando uma situação absolutamente única na Europa: dois gémeos idênticos ocupando os dois cargos mais importantes do país. Lech Kaczynski e o seu partido sempre defenderam "valores tradicionais" que tinham sucesso na conservadora Polónia. Proibiu duas vezes paradas gay e declarou-se a favor do regresso da pena de morte. Uma das suas mais recentes batalhas teve a Europa da União como objecto e pretexto - Lech Kaczynski foi um dos últimos líderes europeus a, primeiro, dar o seu acordo ao novo Tratado de Lisboa; e, posteriormente, promover a sua ratificação, o que acabou por acontecer com visível contragosto. Os insondáveis caminhos da Providência fizeram com que Kaczynski, anti-comunista obstinado e adversário acérrimo da política de Moscovo, viesse a perecer justamente em terras russas e quando se dirigia para um acto solene de homenagem e recordação de vítimas polacas que tombaram às mãos das tropas soviéticas durante a segunda guerra mundial. As autoridades russas nunca esconderam a sua incomodidade com esta homenagem. Hoje, têm de lidar com um problema suplementar que seguramente dispensavam - explicar as causas que determinaram o acidente. As relações polaco-soviéticas, historicamente antagónicas e divergentes, seguramente não terão ficado apaziguadas ou melhoradas.